Em um caso recente, uma moradora apresentou sua recusa em fornecer sua biometria facial para cadastro em condomínio residencial, questionando a ausência de informações claras sobre a política de privacidade, finalidade do uso dos dados e medidas de proteção.
O caso levantou debate sobre a compatibilidade dessa prática com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018 – LGPD) e com os deveres legais e estatutários da administração condominial.
A biometria facial é considerada dado pessoal sensível (art. 5º, II, LGPD), logo o tratamento desses dados exige: consentimento expresso e informado do titular (art. 11, I, LGPD); finalidade específica e previamente informada; política de privacidade clara, contendo forma de coleta, armazenamento, tempo de guarda, compartilhamento e eliminação.
Essa nova posição acarreta um arcabouço de responsabilidades civis e administrativas, especialmente no que tange à proteção de dados pessoais sensíveis, como os biométricos.
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Segurança dos dados
A falha em garantir a segurança na coleta, armazenamento, vazamento ou uso indevido dessas informações sujeita o condomínio a sanções severas, incluindo a obrigação de indenizar por eventuais danos causados aos titulares dos dados, conforme previsto no ordenamento jurídico pátrio.
Portanto, o condomínio, ao decidir pelo uso de biometria, passa a ser controlador de dados (art. 5º, VI, LGPD), respondendo civil e administrativamente por falhas na coleta, armazenamento ou vazamento. O síndico, na qualidade de representante legal (art. 1.348 do Código Civil), tem o dever de zelar pela segurança dos dados e adotar medidas de governança.
O uso de sistemas de reconhecimento facial, quando não deliberado em assembleia, pode ser considerado ato irregular da administração. Alterações que impactam diretamente a vida dos condôminos e implicam coleta de dados pessoais devem ser previamente aprovadas em assembleia por quórum compatível, sob pena de nulidade. A imposição do cadastramento sem alternativas razoáveis (ex.: cartão de acesso, tag, senha) pode configurar abuso de direito e violação ao princípio da autodeterminação informativa.
Direitos dos condôminos
Ademais, o artigo 1.335 do Código Civil estabelece os direitos do condômino, incluindo o uso das partes comuns conforme sua destinação e o direito de voto nas deliberações da assembleia, desde que quite com suas obrigações. A exigência de biometria facial sem o consentimento ou aprovação assemblear restringe o uso das partes comuns e o direito de participação, uma vez que a condômina recusou-se a fornecer seus dados.
O artigo 1.314 do mesmo diploma legal assegura ao condômino o direito de usar a coisa comum conforme sua destinação, mas veda a alteração dessa destinação ou o uso por estranhos sem o consenso dos demais. Deste modo, a imposição de uma nova forma de acesso, que exige a coleta de dados biométricos, sem a devida aprovação, pode ser interpretada como uma alteração indireta na forma de uso das partes comuns, impactando a liberdade individual do condômino.
A análise conjunta da legislação condominial e da LGPD evidencia que a coleta de dados biométricos, por sua natureza sensível e pelo impacto direto na vida dos condôminos, requer transparência, finalidade específica, medidas de segurança adequadas e, fundamentalmente, o consentimento livre, informado e inequívoco, obtido mediante deliberação assemblear com o quórum pertinente. A ausência desses requisitos torna a prática administrativa irregular e potencialmente nula, configurando um abuso de direito por parte da administração e uma violação aos direitos fundamentais dos condôminos
Recomendações a serem adotadas no condomínio:
- Assembleia Deliberativa: aprovação dos condôminos, definindo regras claras de utilização;
- Política de Privacidade Interna: elaboração de documento formal
- Alternativas ao Cadastro: oferecer meios alternativos de acesso;
- Contratação de Empresa Especializada: exigir que a empresa fornecedora do sistema esteja em conformidade com a LGPD;
- Treinamento e Conscientização: capacitar síndico e administradora para cumprimento da LGPD e de conscientização.
Pâmela Moreira | Advogada Especialista em Direito Condominial e Processo Civil

Biometria facial em condomínios e a LGPD